RENATO RUSSO
O FILHO DA REVOLUÇÃO
CARLOS MARCELO
"No início, queríamos fazer com que todos se tocassem de tudo, da situação geral; não aceitar de cara as ordens, as idéias e os esquemas. Fizemos isto de coração, e com o coração falamos da nossa cidade, do mundo jovem e das nossas emoções"
Renato Russo, 1983
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Em 1988, um show para 50 mil pessoas, no estádio Mané Garrincha, em Brasília, deveria ser uma celebração pela volta da Legião Urbana, no auge da carreira, à terra natal. Mas a apresentação, interrompida antes do fim por conta de provocações, brigas e depredações, acabou se transformando em um episódio de frustração e ressentimento entre os que estavam no palco e na platéia. O jornalista Carlos Marcelo, então com 18 anos, estava lá e saiu perplexo com o que testemunhou. Vinte anos depois, utiliza o episódio como ponto de partida e de chegada para a narrativa do livro Renato Russo – O filho da revolução, que está sendo lançado pela Agir e reconstitui o processo de transformação do adolescente Renato Manfredini Júnior no maior ídolo do rock brasileiro.
Além de trazer à tona as primeiras paixões e obsessões do líder da Legião, bem como sua incessante busca de conhecimento em livros, filmes e discos, o livro representa importante contribuição para se rever - ou conhecer - uma época de opressão silenciosa e, nem por isso, menos atuante. Carlos Marcelo desenvolve a trajetória do jovem Renato em paralelo à da jovem cidade, Brasília. Ambos nascidos no mesmo ano, 1960; ambos marcados pela onipresença da ditadura militar. A influência desse momento histórico na formação da juventude urbana brasileira percorre todo o livro, estabelecendo assim “um diálogo rico entre a vida e a obra de um dos nossos maiores compositores e intérpretes”, na definição do escritor Milton Hatoum: “Na figura multifacetada e inquieta de Renato Russo, a junção da trajetória de uma vida breve com o momento histórico nacional, sendo Brasília o epicentro do nosso impasse e da nossa perplexidade”, afirma o autor de Dois Irmãos, que também morou na capital durante a ditadura militar.
Para transportar o leitor à época e à cidade vivida pelo protagonista e assim mostrar a urgência da vida do personagem, o texto é todo escrito em tempo presente, recurso utilizado pelo autor para destacar a urgência da vida do personagem. Ao longo dos capítulos, Carlos Marcelo mostra como Renato Russo observou e absorveu o impacto do que acontecia com ele e suas diversas turmas de amigos em Brasília para escrever letras que sintetizavam sentimentos e anseios da juventude: “Daí a profunda identificação que suas letras despertaram em milhões de jovens. Nesse sentido, Renato Russo - O filho da revolução retrata muito mais o nascimento de um cronista atento ao cotidiano e que burilava suas letras com afinco do que o surgimento de um poeta isolado do mundo, à espera da visita da musa da inspiração”, acredita o autor.
Para escrever Renato Russo – O filho da revolução, o autor realizou uma gigantesca pesquisa. Foram oito anos de trabalho, intercalado com a atividade jornalística como editor-executivo do Correio Braziliense. Mais de uma centena de entrevistas e levantamento de documentos da época, consulta a periódicos (jornais, revistas) dos anos 1970 e 1980 e livros sobre o período da ditadura militar. Muitas das entrevistas envolveram “amigos invisíveis” de Renato Russo, jovens anônimos que conviveram com ele no colégio, no curso de inglês, na faculdade, no bloco de apartamentos onde vivia, na Asa Sul do Plano Piloto, onde chegou em 1973. “Boa parte dessas pessoas jamais tinha sido entrevistada, e conheciam o líder da Legião apenas como Renato ou Júnior: até se surpreenderam ao saber posteriormente que ele tinha montado uma banda de rock”, observa o autor. Também foram ouvidos, no Rio de Janeiro e em São Paulo, alguns nomes essenciais na trajetória profissional de Renato Russo, como Dado Villa-Lobos, Renato Rocha e Marcelo Bonfá, da Legião Urbana; Philippe Seabra e André Mueller, da Plebe Rude; Herbert Vianna e Bi Ribeiro, do Paralamas do Sucesso; Dinho Ouro Preto, Fê Lemos e Flávio Lemos, do Capital Inicial.
A dedicação rendeu frutos: a pesquisa levou à descoberta de manuscritos (reproduzidos pela primeira vez em um livro), letras de canções e documentos inéditos, como os processos do Serviço de Censura de Diversões Públicas da Polícia Federal. Entre eles, o que vetou a divulgação, pelas emissoras de rádio, da música Faroeste Caboclo por “apresentar expressões empregadas por viciados e traficantes de drogas”. E o de Baader-Meinhof Blues, que recebeu parecer contrário à liberação pelo fato de o autor “pregar a violência, inconformismo, descrença no próximo, individualismo e crítica à Justiça”, em “versos dúbios e mensagens negativas de pregação tendenciosa-anarquista, não toleráveis à veiculação irrestrita”.
O livro registra, entre outras curiosidades, o fato de Renato ter pisado no palco pela primeira vez (uma semana antes de completar 18 anos) não como cantor, mas como ator em montagem de alunos da Cultura Inglesa para um texto do dramaturgo Tom Stoppard. E revela também a versatilidade do cantor: formado em Jornalismo, escreveu peças de teatro, atuou em curtas-metragens, participou de antologia de poesias, trabalhou como professor de inglês, repórter e locutor de rádio. As entrevistas para o livro não se limitaram a nomes do mundo roqueiro nacional, como Paulo Ricardo (RPM) e Tony Bellotto (Titãs). Além da família Manfredini e dos amigos anônimos, Carlos Marcelo entrevistou escritores como Millôr Fernandes e Marcelo Rubens Paiva, que tiveram contatos com Renato em diferentes momentos da vida do cantor. E políticos dos anos 70, como o ex-senador mineiro Francelino Pereira, autor da frase “Que país é este?”, que se tornaria título de um dos maiores sucessos da Legião Urbana. O autor obteve ainda depoimentos de personalidades que não tiveram convívio próximo com Renato, mas passaram pelo mesmo processo de transformação ao se mudar para a capital federal, caso de Ney Matogrosso. Todas essas entrevistas tiveram o objetivo de contextualizar a trajetória de Renato Manfredini Júnior, uma história com pontos de identificação com a história de milhões de brasileiros que cresceram nas décadas de 1970 e 1980.
Desejos, angústias, sonhos e confissões de um artista quando jovem.
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“Jornalista em Brasília, como Renato foi um dia, Carlos Marcelo rastreia a energia criadora do ídolo pela cidade. Com finíssimo texto e colossal apuração, ele reconstrói a Brasília da Turma da Colina. Que cidade linda, tediosa e insurgente...”
Arthur Dapieve, autor de Renato Russo – O Trovador Solitário
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Nascido em 1970, Carlos Marcelo é formado em Comunicação Social pela Universidade de Brasília. Já foi repórter e editor de Cultura do Correio Braziliense, onde ocupa desde 2003 a função de editor-executivo. É autor de Nicolas Behr – Eu engoli Brasília (2004), primeiro volume da coleção Brasilienses. Renato Russo – O filho da revolução é seu segundo livro.
Renato Russo – O filho da revolução, de Carlos Marcelo
400 páginas – R$ 59,90 – Editora Agir
Informações/Imprensa: 05.08
Marlene Martelotte: marlenemartelotte@ediouro.com.br
Tels.: (21) 3882-8439 / 8291 / 8462