TÁ RINDO DO QUÊ?


Rolling Stone solta especial humor
Edição de dezembro fala do humor brasileiro, que hoje aposta na cara-de-pau e na piada escrachada






Humoristas brasileiros usam a cara-de-pau como arma, satirizam a vida real e se apóiam em fórmulas clássicas que garantem a boa piada. A TV vive um novo escracho, mas continua a reverenciar os grandes mestres

Confira abaixo um trecho da matéria

O SENHOR DO IMPROVISO


Marcelo Adnet se recusa a fazer humor do mau humor e quer seus 15 minutos de praia

Por Marcelo Ferla

Os engraçadinhos de plantão continuam fazendo piada sobre o caos aéreo, mas receber às 21h30min o cara que esperei desde às 18h no aeroporto de Congonhas não teve graça nenhuma. Vítima de um atraso mal explicado, ele chegou de bermuda, tênis e camiseta com a estampa de Gérson, ídolo do seu Botafogo. Ocupado ao celular, ergueu as vistosas sobrancelhas para sinalizar ter entendido que era eu o desconhecido que iria recebê-lo, levá-lo à MTV, e depois para um estúdio fotográfico, e mais tarde para o pernoite em Santo André - eu também haveria de entrevistá-lo naquela quinta, em algum momento entre o assédio das fãs, a sessão de fotos e os afagos da namorada, Dani Calabresa, comediante de stand-ups e jurada do Quinta Categoria, programa que o teria como convidado naquela noite.

Marcelo Adnet estava cumprindo a quinta ponte aérea Rio-São Paulo da semana. As cenas dos próximos capítulos não seriam menos intensas: na sexta, ia gravar seu programa na MTV e participar do stand-up Comédia ao Vivo, em São Paulo; no sábado voltaria ao Rio para uma reunião e, à noite, se apresentaria na peça Advocacia Segundo os Irmãos Marx, que também teria sessão no domingo, depois de participar de um evento em São Paulo, para onde voltaria na segunda. "Tô sentindo falta de coisas como tomar sol e dar um mergulho no mar. Não tem um dia em que não tenha de ser engraçado, e apesar de meu humor ser espontâneo, é bom ter tempo para organizá-lo", conta o carioca de 27 anos, especialista em imitações, improvisações e paródias musicais, que roubou a cena no último Video Music Brasil, tradicional premiação da MTV, e que tem sentido os efeitos da merecida fama que nunca almejou.

A vida em fast forward do morador do bairro Humaitá, no Rio de Janeiro, filho de pai músico e mãe figurinista, jornalista formado na PUC, revela uma infância típica de praia-Carnaval-futebol, ótimas notas na escola e peculiar rebeldia adolescente traduzida em lições de russo, jogos de xadrez, estudos de astronomia e a mania de imitar pessoas - "mais por esquizofrenia do que por palhaçada". Na faculdade, ele se tornou o aluno carismático e engraçado que circulava com desenvoltura entre playboys e maconheiros, de reconhecia habilidade artística para fazer rimas e transitar por vários ritmos musicais. O talento resultou no convite para participar de uma peça de improvisação. "Topei, embora só tivesse subido uma vez no palco, no Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, quando improvisei um funk inspirado nos PMs a cavalo de lá: 'Os PMs vêm de moto / vêm também de viatura / mas aqui em Porto Alegre / tem outro tipo de dura / pocotó, pocotó, pocotó / a Brigada pocotó'."

Z.É. - Zenas Emprovisadas, a peça da faculdade, está há cinco anos em cartaz. Um dia antes desta entrevista foi vista por 4.200 espectadores, em duas sessões, no Rio. O sucesso catapultou a carreira do improvisador que nunca estudou para atuar. Adnet passou a fazer locução, dublagem, teatro, cinema e jingles. A lista inclui pontas em humorísticos da Globo, na novela Pé na Jaca e em filmes como Podecrê, que ao ser divulgado na na MTV lhe rendeu uma participação tão brilhante no RockGol que gerou um convite para que idealizasse um programa pra-chamar-de-seu na emissora. No despojado 15 Minutos, que apresenta com o mascarado Kiabbo, ele exerce livremente seu humor crítico. Em nome dessa liberdade, rejeitou propostas vantajosas de outras TVs. "Sempre tive dificuldades de fazer humorísticos na Globo. Tenho a necessidade de ser autoral." Centrado, o humorista refuta fazer humor do mau humor, criticar minorias e falar mal do Brasil. Genericamente. "Não gosto de dizer que todo político é filho-da-puta, eu critico coisas específicas. O cenário da MPB atual, por exemplo, é uma bosta. Eu amo futebol, mas odeio Seleção Brasileira, porque virou um balcão de negócios. Eu adoro o Rio, mas lá não tem multa, tem suborno."

Essa capacidade de transformar opiniões fortes e situações corriqueiras em bom humor insere Adnet entre os grandes da nova safra. Sua receita do sucesso é falar direto com o povo. E ignorar as celebridades. "Só falo de celebridade para tirar onda. Fulana de tal se esbaldando na pista de dança. Foda-se! Programa de fofoca. Foda-se! Foi visto com não-sei-quem. Foda-se!" A própria fama recém-adquirida, apesar da satisfação pelo reconhecimento, incomoda. É a privacidade que fica prejudicada, são os fãs que vão às peças pelo ídolo da tela e não pelo texto que ele tanto preza, é a a impossibilidade de continuar sendo o cidadão comum que vê a sociedade se desenrolando no banco do ônibus. "É perigoso se afastar de tudo isso", ele previne. É impossível se privar da vida-como-ela-é para fazer stand-up comedy. Adnet gosta do formato e de dividir a adrenalina com a platéia. "Posso fazer graça sendo mais instintivo." É a deixa para perguntar sem medo de ser mal interpretado: Você se acha engraçado? "Me acho engraçado. Divertido, menos. Não preciso entrar em um personagem para ser humorista, mas preciso de folga. Faço graça, mas gosto de falar sério. Um pouco."

Making Of - especial humor, Rolling Stone, dezembro 2008





+ Marcelo Adnet
+ Marcelo Tas

Fonte: Rolling Stone edição 27, dezembro 2008

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